A Desilusão

domingo, novembro 06, 2011

«Quando a corja topa da janela... o que faz falta... quando o pó que comes sabe a merda... o que faz falta... o que faz falta é avisar a malta...» - Zeca Afonso

Os costumes estão dissolvidos e os caráteres corrompidos. As práticas do quotidiano têm por única direção a conveniência. Não há princípio que não seja desmentido nem instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita e não existem quaisquer sinais de solidariedade entre os cidadãos. Deixou definitivamente de se crer na honestidade dos homens públicos. Os partidos e os políticos não são patriotas e em nada lhes interessa o país e o povo, a sua organização e o seu progresso. A única preocupação que lhes vemos é a de guindar-se ao poder para o usar em seu proveito e apagar o rasto dos que lá estiveram antes. Sanear... por outras palavras! Os partidos e os políticos não têm coerência. O seu critério e a sua moral são a intriga. A intriga política, a intriga partidária... O partido A apoia o candidato B? Pois logo a seguir abandona-o. Porquê? Porque ontem o Presidente era apto e hoje é inapto. Porque ontem era uma salvaguarda para a democracia e hoje é um perigo para a mesma. Porque ontem garantia as liberdades e hoje ameaça-as. A imprensa é venal, rancorosa e torpe nos objetivos e nos meios. Nunca faz justiça, aplaude os seus, acusa os outros e mente desbragadamente. Dia e noite movem-se os prelos, calandra-se o papel, esfalfam-se os tipógrafos, arrasam-se os revisores, emprega-se uma enorme quantidade de trabalho, consomem-se subsídios estatais. E para quê, afinal? Para difundir mentiras, insinuações e calúnias. Para negar a informação em vez de a divulgar, obrigando o cidadão honesto a ler entrelinhas, porque a objectividade dos factos não interessa ao jornalista, interessa, sim, o veneno com que os adultera e deforma. A classe média perdeu a identidade e abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia. Os serviços públicos, cônscios de que para nada servem, são abandonados a uma rotina e a uma burocracia dormentes. O desprezo pelas ideias aumenta de dia para dia e o viver intelectual definha e arrasta-se empobrecido. O português médio não compra um livro de ciência, de literatura ou de história. Os homens leem A Bola e as mulheres a revista Mariana. Os professores não ensinam o pouco que sabem. Os estudantes, consequentemente, não aprendem e a ignorância paira sobre o povo como um nevoeiro cerrado. Perdeu-se a consciência moral e a altivez da dignidade e da opinião. A família, base da sociedade, é o desastre. Os jovens drogam-se, saem de casa e afundam-se na delinquência. Os pais encolhem os ombros e lavam as mãos como se não tivessem qualquer culpa, consolando-se com o mal dos outros. Todas as consciências certificam assim a podridão em que vivemos. Estou triste.
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Cuidado com os teleféricos.

3 comentários:

Mariana Silva disse...

Este texto está extraordinário. Não há um erro, não há uma vírgula mal colocada... que assombro! :p

Emília Pam disse...

Num registo diferente, e antes de vir aqui ler isto, escrevi exactamente o mesmo sentido, mas por palavras diferentes. Achei interessante, pelo simples facto de estarmos os dois tristes. Convido-te a leres, então. E depois conversaremos.

Cumprimentos *

Anônimo disse...

Parabéns I
gostei ainda mais
fm

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